Entenda por que, mais um ano, a Bahia está no topo da violência no Brasil
A Bahia volta a liderar os rankings nacionais de violência, com cinco das dez cidades mais perigosas do país. Mas o que está por trás desses números? Não é só crime — é desigualdade, ausência do Estado e abandono social. Nas periferias baianas, o tráfico se tornou fonte de renda diante do desemprego e da falta de perspectiva.
Lisdeili Nobre
7/26/20253 min read


A Bahia lidera, mais uma vez, os rankings nacionais da violência. Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2025, o estado abriga cinco das dez cidades mais violentas do Brasil — todas com populações acima de 100 mil habitantes e taxas alarmantes de Mortes Violentas Intencionais (MVI). Municípios como Jequié, Juazeiro, Camaçari, Simões Filho e Feira de Santana não são apenas números em gráficos; são territórios onde a vida está cercada pela violência, pela ausência do Estado e por uma rotina de sobrevivência imposta à juventude negra e periférica.
A geografia do medo: o Nordeste no centro da crise
A análise da violência no nível local revela dinâmicas regionais particulares. Das dez cidades com maiores taxas de MVI em 2024, todas estão localizadas no Nordeste: cinco na Bahia, três no Ceará e duas em Pernambuco. Em todas elas, a violência letal tem forte relação com disputas entre facções do crime organizado pelo controle do tráfico de drogas. Esses embates não apenas redesenham os territórios urbanos, como também impõem uma lógica de medo, guerra e recrutamento forçado.
As vítimas têm perfil recorrente: homens, jovens, negros e moradores das periferias. Mas o fenômeno não pode ser lido apenas sob a ótica da criminalidade — ele é produto da desigualdade social crônica que marca a região.
O tráfico como ocupação: quando o Estado se ausenta, o crime preenche
Nas periferias baianas, o tráfico de drogas não é apenas um problema criminal — é um instrumento de mobilidade social distorcida para famílias que não enxergam oportunidades no trabalho formal. Para milhares de jovens, o tráfico se apresenta como o “único caminho possível”, substituindo a escola, o mercado de trabalho e até o convívio comunitário.
Em meio a desigualdade, desemprego e desassistência estatal, o crime organizado não só impõe regras como também oferece uma estrutura de “proteção” e “renda” — ainda que marcada pela violência, exploração e altíssimo risco de morte.
Letalidade policial: a bala do Estado também pesa mais na Bahia
O que chama atenção na análise comparativa entre os estados é o papel desempenhado pelas forças policiais. Em Pernambuco e no Ceará, a participação dos agentes do Estado nas mortes violentas é relativamente baixa. Em Maranguape (CE), por exemplo, apenas 2% das MVI tiveram envolvimento policial, e em Cabo de Santo Agostinho (PE), esse número foi de 3%.
Já na Bahia, os índices são alarmantes. Em Jequié, um em cada três homicídios foi causado por intervenção policial. Em Simões Filho, a proporção é de um a cada quatro mortes. Esses dados revelam um padrão de letalidade policial muito acima da média nacional, o que reacende o debate sobre o uso excessivo da força e a militarização do enfrentamento ao crime em comunidades vulneráveis.
Mapa da violência é o mapa do abandono
Não por acaso, as cidades que figuram no topo do ranking de violência também enfrentam pésimos índices de desenvolvimento humano, falta de saneamento básico, infraestrutura precária e baixa cobertura da atenção primária à saúde. Em muitas delas, o acesso à água tratada é intermitente, as unidades de saúde são escassas e a evasão escolar é crescente.
Nessas condições, o consumo de substâncias entorpecentes acaba sendo também um reflexo da falta de suporte emocional e psicológico, agravada por quadros de depressão, ansiedade e outras fadigas sociais, não tratadas pelo sistema de saúde.
Conclusão: não é só bala, é também fome, abandono e invisibilidade
A violência que assola a Bahia — e o Nordeste — não será resolvida apenas com mais policiamento. A segurança pública precisa ser entendida como parte de um projeto social mais amplo, que envolva educação, saúde mental, assistência social, emprego e renda. A ausência de políticas públicas estruturantes cria o terreno ideal para o crime florescer e para a morte se tornar rotina.
Enquanto isso, cidades inteiras continuam à margem das prioridades institucionais. E os jovens, em vez de sonhar, são recrutados. E as mães, em vez de celebrar, enterram seus filhos.
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