COLUNA DE OPINIÃO – ENTRE O RIO E O TETO

Cumprir a lei ambiental é necessário, mas sem política habitacional sólida, o gesto correto pode virar um novo problema social.

LISDEILI NOBRE

8/28/20252 min read

A Prefeitura de Itabuna iniciou a remoção de sete construções irregulares na Rua da Bananeira, às margens do Rio Cachoeira. Medida necessária, sem dúvida: trata-se de Área de Preservação Permanente (APP), espaço em que a lei não permite edificação. Além de preservar o meio ambiente, é uma questão de vida. Desde as enchentes de 2021, Itabuna firmou compromisso com o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional de não permitir que novas tragédias se repitam — e o cumprimento da palavra pública é um passo importante.

A secretária Sônia Fontes tem razão quando afirma que não se pode admitir novas ocupações em locais de risco. Porém, a cada casa retirada, surge a pergunta que ecoa mais forte do que o barulho das retroescavadeiras: para onde vão essas famílias?

Sim, parte delas recebe aluguel social, cerca de 30% de um salário mínimo, mas esse benefício é um paliativo que não substitui o direito à moradia digna. Ainda mais quando sabemos que algumas das edificações demolidas não eram lares, mas imóveis alugados para pequenos comércios — um sintoma claro da ausência de uma política de habitação estruturada e de desenvolvimento urbano que vá além da lógica emergencial.

É o velho dilema brasileiro: destampa-se um santo para cobrir outro. Retira-se da beira do rio, mas ainda não se apresenta um plano sólido de reassentamento, com unidades habitacionais completas, dotadas de infraestrutura, escolas, postos de saúde e transporte público no entorno. Não basta derrubar: é preciso construir perspectivas.

Nesse contexto, a convocação da secretária Sônia Fontes, aprovada pelo vereador Danilo Freitas, pode abrir o debate público sobre duas frentes urgentes:

  1. A manutenção e limpeza do Rio Cachoeira, patrimônio ambiental e histórico da cidade;

  2. As metas e estratégias de desenvolvimento habitacional que precisam acompanhar a política ambiental, sob pena de se transformar um gesto correto em mais um problema social.

Cumprir a lei ambiental é dever. Cumprir o direito à moradia é obrigação. Entre o rio e o teto, a cidade só será inteligente quando conseguir equilibrar os dois lados da balança.