Assédio Digital em Espaços Masculinos: Jornalistas Sofrem Importunação Sexual no Esporte

No universo da cobertura esportiva, onde a presença feminina ainda é uma exceção, o relato de Bianca Molina, repórter de futebol da TNT Sports, traz à tona uma realidade alarmante: a importunação sexual digital. Enquanto se preparava para iniciar o dia de trabalho após uma sessão de treino, Bianca recebeu no Instagram uma mensagem carregada de conotação ofensiva e explícita – “Toda a feminista igual a você gosta muito disso. Não gosta?” – acompanhada de um vídeo em que um homem se masturbava. Essa experiência, lamenta a jornalista, faz parte de um cotidiano de agressões não apenas verbais, mas também digitais, direcionadas a mulheres que atuam em áreas tradicionalmente dominadas por homens.

Lisdeili Nobre

4/11/20254 min read

Assédio Digital em Espaços Masculinos: Jornalistas Sofrem Importunação Sexual no Esporte

Por Lisdeili Nobre – 11 de abril de 2025

No universo da cobertura esportiva, onde a presença feminina ainda é uma exceção, o relato de Bianca Molina, repórter de futebol da TNT Sports, traz à tona uma realidade alarmante: a importunação sexual digital. Enquanto se preparava para iniciar o dia de trabalho após uma sessão de treino, Bianca recebeu no Instagram uma mensagem carregada de conotação ofensiva e explícita – “Toda a feminista igual a você gosta muito disso. Não gosta?” – acompanhada de um vídeo em que um homem se masturbava. Essa experiência, lamenta a jornalista, faz parte de um cotidiano de agressões não apenas verbais, mas também digitais, direcionadas a mulheres que atuam em áreas tradicionalmente dominadas por homens.

A agressão digital, que pode incluir desde comentários invasivos e cantadas explícitas até o envio não solicitado de imagens pornográficas, evidencia uma clara prática de invasão de privacidade e violação da integridade pessoal. Bianca resume seu sentimento da seguinte forma:
“Uma mão na minha bunda é uma violação, assim como uma mensagem com o pênis de um homem que eu não conheço é uma violação. Me senti desrespeitada, violentada, invadida.”

Este episódio isolado reflete um padrão de assédio: diariamente, diversas jornalistas recebem conteúdos pornográficos não solicitados, enviados por homens desconhecidos, que se aproveitam da ampla circulação de redes sociais. Muitas vezes, diante da naturalização desses comportamentos – bloqueiam os agressores e apagam as mensagens – as vítimas hesitam em acionar as autoridades, temendo que suas denúncias sejam minimizadas. “Fiquei com a impressão de que vou numa delegacia e vão falar: ‘Mas ele não te fez nada, ele só mandou um vídeo que tu nem precisava assistir’. Criei diálogos que poderiam acontecer que me desencorajaram”, desabafa Bianca.

─────────────────────────────
Análise do Crime de Importunação Sexual e Seus Desdobramentos

A lei 13.718, de 2018, tipifica o ato de enviar e publicar conteúdo pornográfico sem o consentimento da vítima como crime, considerando-o uma prática libidinosa ou de satisfação da lascívia, com pena que varia entre 1 e 5 anos de reclusão. Apesar desse respaldo legal, a concretização das punições é raríssima, contribuindo para um cenário onde a impunidade se instala e serve de incentivo para novos abusos.

1. Contexto Social e Cultural
O caso de Bianca Molina é emblemático dentro de um contexto mais amplo em que aproximadamente 29 milhões de brasileiras foram assediadas em 2024. Esse dado expressivo ilustra a amplitude do problema e evidencia que, para muitas mulheres, especialmente aquelas inseridas em ambientes considerados masculinos – como o futebol e outros espaços midiáticos – o risco de sofrer importunação sexual torna-se um fator constante de vulnerabilidade.

2. A Estratégia dos Agressores
A mensagem recebida por Bianca, combinada com o envio de imagens inapropriadas, demonstra o uso das redes sociais como palco para a agressão. A facilidade de anonimato oferecida por essas plataformas potencializa comportamentos abusivos. Ademais, o fato de o agressor ter utilizado imagens de uma criança em seu perfil agrava a situação, realçando a perversidade e a extrema desumanização presentes nessas atitudes. Em algumas ocasiões, os agressores inclusive buscam desafiar as vítimas publicamente – como no caso em que, após a primeira reação de Bianca, o homem provocou: “Gosta de exibir? Vou aguardar o seu processo de p... duro.”

3. Lacunas na Aplicação da Lei e na Proteção das Vítimas
Embora a legislação seja clara quanto à criminalização desses atos, a realidade mostra que o medo de não ser levado a sério e o receio de revitimização nos ambientes institucionais desestimulam as denúncias. Muitas vezes, as vítimas optam por estratégias de autoproteção, como bloquear os remetentes e deletar as mensagens, sem recorrer ao apoio das autoridades. Essa situação evidencia uma falha significativa tanto na implementação das leis quanto na criação de uma rede de suporte eficaz para as vítimas.

4. Impacto Psicológico e Profissional
Além dos danos imediatos à integridade e à privacidade, o assédio constante tem implicações profundas na saúde mental e na carreira das profissionais. O sentimento de violação e desrespeito pode minar a confiança e afetar a performance, além de contribuir para a manutenção de um ambiente hostil que desestimula a entrada e a permanência de mulheres em áreas que historicamente foram dominadas por homens.

─────────────────────────────
Conclusão

O relato de Bianca Molina é um espelho que reflete a realidade de muitas mulheres que atuam em ambientes públicos e, principalmente, em espaços tradicionalmente masculinos. A importunação sexual, expressa através de agressões digitais como o envio de conteúdos pornográficos e mensagens de teor explícito, revela uma problemática social que ultrapassa o âmbito individual, expondo lacunas na eficácia legal e na proteção das vítimas.

Enquanto a legislação existe – com a previsão de prisão de 1 a 5 anos –, a cultura da impunidade e a naturalização desses comportamentos impedem que medidas eficazes sejam tomadas. Assim, torna-se urgente a criação de políticas públicas e mecanismos institucionais que não apenas punam os agressores, mas também ofereçam suporte real e acolhimento às vítimas, contribuindo para um ambiente de trabalho mais seguro e respeitoso para todas as profissionais.

Continua em nossas próximas edições…

Fonte original: UOL Esporte
(Citação dos trechos reportados: “minha rede social não me pertence: rotina de assédio ameaça jornalistas”)